segunda-feira, 12 de agosto de 2013

VIDA DE GRANDES HOMENS


"As Ações do Justo São Fonte de Vida." Provérbios 11:30

A HISTÓRIA sagrada apresenta muitas ilustrações dos resultados da verdadeira educação. Apresenta muitos nobres exemplos de homens cujo caráter foi formado sob direção divina; homens cuja vida foi uma bênção a seus semelhantes, e que estiveram no mundo como representantes de Deus. Entre estes se acham José, Daniel, Moisés, Elias e Paulo - respetivamente estadista, sapientíssimo legislador, reformador dentre os mais fiéis, e o mais ilustre instrutor que o mundo já conheceu, com exceção d'Aquele que falou como nenhum outro.


José, Íntegro Estadista
No princípio de sua vida, exatamente quando passavam da juventude para a varonilidade, José e Daniel foram separados de seus lares, e levados como cativos a países pagãos. José esteve sujeito especialmente às tentações que acompanham grandes mudanças na sorte. Na casa paterna, uma criança mimada; na casa de Potifar, escravo, depois confidente e companheiro; homem de negócios, educado pelo estudo, observação e contato com os homens; no calabouço de Faraó, prisioneiro do Estado, condenado injustamente, sem esperança de reivindicação ou perspetiva de libertamento. Chamado numa grande crise para dirigir a nação - o que o habilitou a preservar a sua integridade?
Ninguém pode ficar numa altura proeminente sem correr perigo. Assim como a tempestade deixa intacta a flor do vale e desarraiga a árvore no topo das montanhas, as terríveis tentações que deixam ilesos os humildes da vida, assaltam os que se acham nos altos postos de êxito e honras. José, porém, suportou a prova da adversidade, e da prosperidade, de modo semelhante. A mesma fidelidade que manifestou nos palácios de Faraó, manifestou na cela do prisioneiro.
Na sua meninice, havia sido ensinado a José o amor e temor de Deus. Muitas vezes, na tenda do seu pai, sob as estrelas da Síria, contava-se-lhe a história da visão noturna de Betel, da escada do Céu à Terra e dos anjos que por ela desciam e subiam, e d'Aquele que do trono, no alto, Se revelou a Jacó. Fora-lhe contada a história do conflito ao lado do rio Jaboque, quando renunciando a pecados acariciados, Jacó se tornou conquistador e recebeu o título de Príncipe com Deus.

A vida pura e simples de José, como um pastorzinho guiando os rebanhos do seu pai, favorecera o desenvolvimento não só da capacidade física mas também da mental. Em comunhão com Deus por meio da Natureza e do estudo das grandes verdades transmitidas como um sagrado legado de pai a filho, adquiriu ele vigor mental e firmeza de princípios.
No momento crítico da sua vida, quando fazia aquela terrível viagem do lar da sua infância em Canaã, para o cativeiro que o esperava no Egito, olhando pela última vez as colinas que ocultavam as tendas da sua parentela, José lembrou-se do Deus de seu pai. Recordou-se das lições da infância e a sua alma estremeceu com a resolução de mostrar-se verdadeiro - agindo sempre como convém a um súbdito do Rei celestial.
Na amargurada vida de estrangeiro e escravo, entre as cenas e os ruídos do vício e das seduções do culto pagão, culto este cercado de todas as atrações de riquezas, cultura e pompas da realeza, José permaneceu firme. Tinha aprendido a lição da obediência ao dever. A fidelidade em todas as situações, desde as mais humildes até às mais exaltadas, adestrou toda a sua capacidade para o mais elevado serviço.
Na ocasião em que ele fora chamado à corte de Faraó, o Egito era a maior das nações. Em civilização, arte, saber, era inigualado. Através de um período de máxima dificuldade e perigo, José administrou os negócios do reino; e isto fez de maneira a captar a confiança do rei e do povo. Faraó fez dele "senhor da sua casa, e governador de toda a sua fazenda, para a seu gosto sujeitar os seus príncipes, e instruir os seus anciãos." (Salmo 105:21, 22).
A Bíblia apresenta-nos o segredo da vida de José. Jacó, na bênção pronunciada sobre os seus filhos, assim falou, em palavras de divino poder e beleza, daquele dentre eles que mais amava:

"José é um ramo frutífero, ramo frutífero junto à fonte;
seus galhos se estendem sobre o muro.
Os frecheiros lhe dão amargura, atiram contra ele e o aborrecem.
O seu arco, porém, permanece firme,
e os seus braços são feitos ativos pelas mãos do Poderoso de Jacó,
sim, pelo Pastor e pela Pedra de Israel,
pelo Deus de teu pai, o qual te ajudará, e pelo Todo-poderoso,
o qual te abençoará, com bênçãos dos altos céus,
com bênçãos das profundezas, com bênçãos dos seios e da madre.
As bênçãos de teu pai excederão as bênçãos de meus pais
até ao cimo dos montes eternos;
estejam elas sobre a cabeça de José, e sobre o alto da cabeça
do que foi distinguido entre seus irmãos."


(Génesis 49:22-26, Bíblia Vida Nova)

Lealdade para com Deus, fé no invisível - foram a âncora de José. Nisto se encontrava o segredo do seu poder: "E os seus braços são feitos ativos pelas mãos do Poderoso de Jacó."


Daniel, um Embaixador do Céu
Daniel e os seus companheiros, em Babilónia, foram aparentemente mais favorecidos da sorte, na sua juventude, do que o foi José, nos primeiros anos da sua vida no Egito; não obstante, estiveram sujeitos a provas de caráter quase tão severas como as suas. Vindos do seu lar judeu, de relativa simplicidade, estes jovens da linhagem real foram transportados à mais magnificente das cidades, para a corte do seu maior monarca, e separados a fim de ser instruídos para o serviço especial do rei. Fortes eram as tentações que os cercavam naquela corte corrupta e luxuosa. O fato de que eles, os admiradores de Jeová, eram cativos em Babilónia; de que os vasos da casa de Deus tinham sido postos no templo dos deuses de Babilónia; de que o próprio rei de Israel era um prisioneiro nas mãos dos babilónios, era jactanciosamente citado pelos vitoriosos como evidência de que a sua religião e costumes eram superiores aos dos hebreus. Sob tais circunstâncias, e por meio das próprias humilhações ocasionadas pelo afastamento de Israel dos mandamentos de Deus, Ele apresentou a Babilónia evidências da Sua supremacia, da santidade dos Seus mandamentos, e do resultado certo da obediência. E este testemunho Ele deu - como unicamente poderia ter dado - por meio daqueles que ainda mantinham firme a sua fidelidade.
A Daniel e seus companheiros, logo ao princípio da sua carreira, sobreveio uma prova decisiva. A ordem de que o seu alimento deveria ser suprido da mesa do rei foi uma expressão do favor real, bem como da sua solicitude pelo bem-estar deles. Mas, sendo uma parte oferecida aos ídolos, o alimento da mesa real era consagrado à idolatria; e, participando da munificência do rei, estes jovens seriam considerados como se estivessem unindo a sua homenagem aos falsos deuses. A sua fidelidade para com Jeová proibia-lhes participar de tal homenagem. Tampouco ousavam eles arriscar-se aos efeitos enervantes do luxo e dissipação sobre o desenvolvimento físico, intelectual e espiritual.

Daniel e os seus companheiros tinham sido fielmente instruídos nos princípios da palavra de Deus. Haviam aprendido a sacrificar o terrestre pelo espiritual, a buscar o mais alto bem. Os seus hábitos de temperança e o seu senso de responsabilidade como representantes de Deus, reclamavam o mais nobre desenvolvimento das faculdades do corpo, da mente e da alma. Ao terminar o seu preparo, sendo examinados com outros candidatos às honras do reino "não foram achados outros tais como Daniel, Hananias, Misael, e Azarias." (Daniel 1:19).
Na corte de Babilónia estavam reunidos representantes de todos os países, homens dos melhores talentos, dos mais abundantemente favorecidos com dons naturais e possuidores da mais alta cultura que o mundo poderia conferir; no entanto, entre todos eles, os cativos hebreus não tinham igual. Na força física e na beleza, no vigor mental e preparo literário, não tinham rival. "E em toda a matéria de sabedoria, e de inteligência, sobre que o rei lhes fez perguntas, os achou 10 vezes mais doutos do que todos os magos ou astrólogos que havia em todo o reino." (Daniel 1:20).
Inabalável na sua aliança com Deus, intransigente no domínio de si próprio, a nobre dignidade e delicada deferência de Daniel ganharam para ele na sua mocidade o "favor e terno amor" do oficial gentio a cargo do qual ele se achava. As mesmas características assinalaram a sua vida. Rapidamente ele galgou a posição de 1º ministro do reino. Durante o império de sucessivos monarcas, a queda da nação e o estabelecimento de um reino rival, tal era a sua sabedoria e qualidades de estadista, tão perfeitos o seu tato, cortesia e genuína bondade de coração, combinada com a fidelidade aos princípios, que mesmo os seus inimigos eram obrigados a confessar que "não podiam achar ocasião ou culpa alguma, porque ele era fiel." (Daniel 6:4).

Apegando-se Daniel a Deus com inabalável confiança, o espírito do poder profético veio sobre ele. Sendo honrado pelos homens com as responsabilidades da corte e os segredos do reino, honrado foi por Deus como Seu embaixador, bem como instruído a ler os mistérios dos séculos vindouros. Monarcas pagãos, mediante a associação com o representante do Céu, foram constrangidos a reconhecer o Deus de Daniel. "Certamente," declarou Nabucodonosor, "o vosso Deus é Deus dos deuses, e o Senhor dos reis, e o revelador dos segredos." E Dario na sua proclamação "a todos os povos, nações e gente de diferentes línguas, que moram em toda a Terra," exaltou o "Deus de Daniel" como "o Deus vivo e para sempre permanente, e o Seu reino não se pode destruir;" que "livra e salva, e opera sinais e maravilhas no céu e na Terra." (Daniel 2:47; 6:25-27).

Homens Fiéis e Honestos

Pela sua sabedoria e justiça, pela pureza e benevolência da sua vida diária, pela sua dedicação aos interesses do povo - e este era idólatra - José e Daniel mostraram-se fiéis aos princípios da sua primeira educação, fiéis para com Aquele de quem eram os representantes. A tais homens, tanto no Egito como em Babilónia, a nação toda honrou; e neles, um povo pagão, assim como todas as nações com quem entretiveram relações, contemplaram uma ilustração da bondade e beneficência de Deus, uma imagem do amor de Cristo.
Que considerável obra foi a que executaram estes nobres hebreus durante a sua vida! Quão pouco sonhariam eles com seu alto destino, ao se despedirem do lar de sua meninice! Fiéis e firmes, entregaram-se à direção divina, de maneira que por intermédio deles Deus pôde cumprir o Seu propósito.
As mesmas grandiosas verdades que foram reveladas por estes homens, Deus deseja revelar por meio dos jovens e crianças de hoje.
A história de José e Daniel é uma ilustração daquilo que Ele fará pelos que se entregam a Ele, e que de todo o coração procuram cumprir o Seu propósito.

A maior necessidade do mundo é a de homens - homens que não se comprem nem se vendam; homens que no íntimo da alma sejam verdadeiros e honestos; homens que não temam chamar o pecado pelo seu nome exato; homens, cuja consciência seja tão fiel ao dever como a bússola o é ao polo; homens que permaneçam firmes pelo que é reto, ainda que caiam os céus.
Mas um caráter tal não é obra do acaso; nem se deve a favores e concessões especiais da Providência. Um caráter nobre é o resultado da disciplina própria, da sujeição da natureza inferior pela superior - a renúncia do eu para o serviço de amor a Deus e ao homem.
Os jovens precisam de ser impressionados com a verdade de que os seus dotes não são deles próprios. Força, tempo, intelecto - não são senão tesouros emprestados. Pertencem a Deus; e deve ser a decisão de todo o jovem pô-los no mais elevado uso. O jovem é um ramo do qual Deus espera fruto; um mordomo cujo capital deve crescer; uma luz para iluminar as trevas do mundo. Cada jovem, cada criança, tem uma obra a fazer para honra de Deus e erguimento da humanidade.



Eliseu, Fiel em Coisas Pequenas
Os primeiros anos da vida do profeta Eliseu passaram-se na quietude da vida campesina, sob o ensino de Deus e da Natureza, e na disciplina do trabalho útil. Num tempo de quase universal apostasia, a casa do seu pai estava entre o número dos que não tinham dobrado os joelhos a Baal. Na sua casa Deus era honrado, e a fidelidade ao dever era regra da vida diária.
Filho de um abastado fazendeiro, Eliseu havia assumido o trabalho que mais perto estava. Conquanto possuísse capacidade para ser um dirigente entre os homens, recebeu ensino nos deveres usuais da vida. A fim de dirigir sabiamente, ele devia aprender a obedecer. Pela fidelidade nas coisas pequenas, preparou-se para os encargos maiores.
Dotado de espírito meigo e gentil, possuía Eliseu também energia e firmeza. Acariciava o amor e temor de Deus, e na humilde rotina do trabalho diário adquiria força de propósitos e nobreza de caráter, crescendo na graça e no conhecimento divinos. Enquanto cooperava com o seu pai nos deveres domésticos, aprendia a cooperar com Deus.
O chamado profético veio a Eliseu, quando com os servos do seu pai arava o campo. Quando Elias, divinamente guiado na procura de um sucessor, lançou a sua capa sobre os ombros de Eliseu, reconheceu este moço aquele chamado e lhe obedeceu. Ele "seguiu a Elias, e o servia." (I Reis 19:21). Não era uma grande obra a que se requeria a princípio de Eliseu; deveres usuais ainda constituíam a sua disciplina. Fala-se dele como o que despejava água às mãos de Elias, seu senhor. Como ajudante pessoal do profeta, continuou a mostrar-se fiel nas coisas pequenas, enquanto com um propósito cada dia mais firme se dedicava à missão a ele designada por Deus.
Ao ser chamado, a sua resolução foi provada. Ao volver-se para acompanhar a Elias, recebeu ordem do profeta para voltar para casa. Ele devia avaliar por si as dificuldades - decidir-se a aceitar ou rejeitar o chamado. Eliseu, porém, compreendeu o valor da sua oportunidade. Por nenhuma vantagem mundana desprezaria ele a oportunidade de se tornar mensageiro de Deus, ou sacrificar o privilégio da associação com o Seu servo.

À medida que passava o tempo, e Elias se preparava para a trasladação, Eliseu se aprontava para se tornar seu sucessor. E de novo a sua fé e resolução foram provadas. Acompanhando a Elias no seu trabalho do costume, e sabendo a mudança que logo ocorreria, era em cada lugar convidado pelo profeta para voltar. "Fica-te aqui, porque o Senhor me enviou a Betel", disse Elias. Mas, nos seus primeiros trabalhos de guiar o arado, Eliseu tinha aprendido a não fracassar nem desanimar; e agora que ele havia posto a mão ao arado para os deveres de outra natureza, não se desviaria do seu propósito. Tantas vezes quantas lhe era feito o convite para voltar, a sua resposta era: "Vive o Senhor, e vive a tua alma, que te não deixarei." (II Reis 2:2).
"E assim ambos foram juntos... E ambos pararam junto ao Jordão. Então Elias tomou a sua capa, e a dobrou, e feriu as águas, as quais se dividiram para as duas bandas: e passaram ambos em seco. Sucedeu pois que, havendo eles passado, Elias disse a Eliseu: Pede-me o que queres que te faça, antes que seja tomado de ti. E disse Eliseu: Peço-te que haja porção dobrada do teu espírito sobre mim. E disse: Coisa dura pediste; se me vires quando for tomado de ti, assim se te fará; porém, se não, não se fará. E sucedeu que indo eles andando e falando, eis que um carro de fogo, com cavalos de fogo, os separou um do outro; e Elias subiu ao céu num redemoinho.
"O que vendo Eliseu, clamou: Meu pai, meu pai, carros de Israel, e seus cavaleiros! E nunca mais o viu; e, tomando os seus vestidos, os rasgou em duas partes. Também levantou a capa de Elias, que lhe caíra; e voltou-se e parou à borda do Jordão. E tomou a capa de Elias, que lhe caíra, e feriu as águas e disse: Onde está o Senhor, Deus de Elias? Então feriu as águas, e se dividiram elas para uma e outra banda; e Eliseu passou. Vendo-o pois os filhos dos profetas que estavam defronte em Jericó, disseram: O espírito de Elias repousa sobre Eliseu. E vieram-lhe ao encontro, e se prostraram diante dele em terra". (II Reis 2:6-15). Desde então Eliseu ficou em lugar de Elias. E aquele que fora fiel no mínimo, mostrou-se também fiel no muito.

Elias, homem dotado de poder, tinha sido o instrumento de Deus na subversão de males gigantescos. Fora derribada a idolatria que, mantida por Acabe e pela gentílica Jezabel, havia seduzido a nação. Os profetas de Baal tinham sido mortos. Todo o povo de Israel tinha sido profundamente abalado, e muitos estavam voltando ao culto a Deus. Como sucessor de Elias era necessário alguém que por meio de instrução cuidadosa e paciente pudesse guiar Israel nos caminhos seguros. Para tal trabalho o primitivo ensino de Eliseu, sob a direção de Deus, o havia preparado.
A lição é para todos. Ninguém pode saber qual seja o propósito de Deus em Sua disciplina; mas todos podem estar certos de que a fidelidade nas pequenas coisas é a evidência do preparo para as maiores responsabilidades.
Cada ato da vida é uma revelação do caráter, e somente aquele que nos menores deveres se mostre "obreiro que não tem de que se envergonhar" (II Timóteo 2:15), será honrado por Deus com encargos de mais responsabilidade.


Moisés, Poderoso Pela Fé
Mais jovem do que José ou Daniel era Moisés quando foi removido do amparador cuidado do lar da sua infância; não obstante, as mesmas influências que haviam moldado a vida daqueles, tinham já modelado a sua. Apenas doze anos passara ele com os parentes hebreus; mas durante estes anos lançou-se o fundamento da sua grandeza; lançara-o a mão de alguém que não deixou nome memorável.
Joquebede era mulher e escrava. A sua porção na vida era humilde e os seus encargos pesados. Mas, com exceção de Maria de Nazaré, por intermédio de nenhuma outra mulher recebeu o mundo maior bênção. Sabendo que o seu filho logo deveria sair de sob os seus cuidados, para passar aos daqueles que não conheciam a Deus, da maneira mais fervorosa se esforçou ela por unir a sua alma ao Céu. Procurou implantar no seu coração amor e lealdade para com Deus. E fielmente cumpriu este trabalho. Aqueles princípios da verdade que eram a preocupação do ensino de sua mãe e a lição da sua vida, nenhuma influência posterior poderia induzir Moisés a renunciar.
Do humilde lar em Gósen, o filho de Joquebede passou ao palácio dos Faraós, à princesa egípcia, e por meio desta veio a ser bem recebido como filho amado e acariciado. Nas escolas do Egito, Moisés recebeu o mais alto preparo civil e militar. De grande atração pessoal, distinto na aparência e estatura, de espírito culto e porte principesco, e de fama como chefe militar, tornou-se o orgulho da nação. O rei do Egito também era membro do sacerdócio; e Moisés, apesar de se recusar a participar do culto pagão, era iniciado em todos os mistérios da religião egípcia. Sendo ainda nessa época o Egito a mais poderosa e mais altamente civilizada das nações, Moisés como seu provável soberano era herdeiro das mais altas honras que este mundo podia conferir. A sua escolha, porém, foi mais nobre. Por amor da honra de Deus e livramento do Seu povo oprimido, Moisés sacrificou as honras do Egito. Então, de maneira especial, Deus empreendeu a sua educação.

Moisés ainda não estava preparado para a obra da sua vida. Tinha ainda de aprender a lição de confiança no poder divino. Ele havia compreendido mal o propósito de Deus. Era sua esperança libertar Israel pela força das armas. Para isto arriscou tudo e fracassou. Derrotado e dececionado, tornou-se fugitivo e exilado em terra estranha.
Nos desertos de Midiã, Moisés passou quarenta anos como pastor de ovelhas. Aparentemente afastado para sempre da missão da sua vida, estava recebendo a disciplina essencial para o seu cumprimento. A sabedoria para governar uma multidão ignorante e indisciplinada deveria ser ganha pelo domínio de si próprio. No cuidado das ovelhas e dos tenros cordeiros deveria obter a experiência que faria dele fiel e longânimo pastor para Israel. Para que pudesse tornar-se um representante de Deus, deveria d'Ele aprender.
As influências que o haviam cercado no Egito, a afeição da sua mãe adotiva, a sua própria posição como neto do rei, o luxo e o vício que o seduziam de dez mil maneiras; o apuro, subtileza e misticismo de uma religião falsa, tinham produzido certa impressão no seu espírito e caráter. Na rude simplicidade do deserto tudo isto desapareceu.
Na solene majestade da solidão das montanhas, Moisés estava a sós com Deus. Em toda a parte estava escrito o nome do Criador. Moisés parecia achar-se na Sua presença, e protegido pelo Seu poder. Ali a sua presunção foi afugentada. Na presença do Ser infinito ele se compenetrou de quão fraco, quão ineficiente e quão curto de vista é o homem.

Ali Moisés adquiriu aquilo que o acompanhou durante os anos da sua vida trabalhosa e sobrecarregada de cuidados - a intuição da presença pessoal do Ser divino. Não olhava meramente através dos séculos para Cristo a manifestar-Se em carne; via a Cristo acompanhando o exército de Israel em todas as suas viagens. Quando era mal compreendido, ou difamadas as suas ações, ou quando tinha de suportar a ignomínia e o insulto, e enfrentar o perigo e a morte, estava ele habilitado a resistir "como vendo o Invisível." (Hebreus 11:27).
Moisés não pensava simplesmente acerca de Deus; ele via a Deus. Deus era a constante visão diante dele. Nunca perdeu de vista a Sua face.
Para Moisés, a fé não era uma conjetura, era a realidade. Ele cria que Deus dirigia a sua vida em particular, e em todos os seus detalhes ele O reconhecia. Para obter a força a fim de resistir a todas as tentações, confiava n'Ele.
A grande obra que lhe era confiada, desejava fazê-la com o maior êxito possível, e pôs a sua confiança toda no poder divino. Sentiu sua necessidade de auxílio, pediu-o, adquiriu-o pela fé, e saiu na certeza de manter a força.
Tal foi a experiência que Moisés alcançou com os quarenta anos de preparo no deserto. Para comunicar tal experiência, a Sabedoria Infinita não considerou demasiado longo o período nem excessivamente grande o preço.
Os resultados daquele preparo, e das lições então ensinadas, ligam-se intimamente, não só à história de Israel, mas a tudo que desde aquele tempo até hoje tem contribuído para o progresso do mundo. O mais elevado testemunho da grandeza de Moisés, ou seja, o juízo feito da sua vida pela Inspiração, é: "Nunca mais se levantou em Israel profeta algum como Moisés, a quem o Senhor conhecera cara a cara". (Deuteronómio 34:10).


Paulo, Alegre no Serviço
Com a fé e experiência dos discípulos galileus que haviam feito companhia a Jesus, encontraram-se reunidos na obra do evangelho o indómito vigor e o poder intelectual de um rabi de Jerusalém. Cidadão romano, nascido numa cidade gentílica, e judeu não somente por descendência mas por ensinos recebidos em toda a sua vida, por patriotismo e religião; educado em Jerusalém pelo mais eminente dos rabis, e instruído em todas as leis e tradições dos pais, Saulo de Tarso participava no maior grau do orgulho e dos preconceitos da sua nação. Ainda jovem, tornou-se honrado membro do sinédrio. Era considerado homem promissor, zeloso defensor da antiga fé.
Nas escolas teológicas da Judeia, a Palavra de Deus tinha sido preterida pelas especulações humanas; tinha sido privada do seu poder pelas interpretações e tradições dos rabis. Exaltação própria, amor ao domínio, cioso exclusivismo, fanatismo e orgulho desdenhoso, eram os princípios e motivos que regiam estes ensinadores.
Os rabis gloriavam-se na sua superioridade não somente sobre o povo de outras nações, mas também sobre a multidão do seu próprio país. Com ódio feroz aos seus opressores romanos, acariciavam a resolução de recuperar pela força das armas a sua supremacia nacional. Aos seguidores de Jesus, cuja mensagem de paz era tão contrária aos seus ambiciosos planos, odiaram e mataram. Nesta perseguição, Saulo era um dos atores mais atrozes e implacáveis.
Nas escolas militares do Egito, foi ensinada a Moisés a lei da força, e tão fortemente se apegou este ensino ao seu caráter que foram precisos quarenta anos de quietação e comunhão com Deus e a Natureza para habilitá-lo à chefia de Israel pela lei do amor. A mesma lição Paulo teve de aprender.

Às portas de Damasco a visão do Crucificado mudou todo o curso da sua vida. O perseguidor tornou-se discípulo; o mestre, aluno. Os dias de trevas passados em solidão em Damasco foram como anos em sua experiência. As Escrituras do Velho Testamento, entesouradas, na sua memória, foram o seu estudo, e Cristo o seu mestre. Para ele também a solidão da Natureza se tornou uma escola. Para o deserto da Arábia foi ele, a fim de estudar ali as Escrituras e aprender acerca de Deus. Esvaziou a alma dos preconceitos e tradições que lhe haviam moldado a vida e recebeu instruções da Fonte da verdade.
Sua vida posterior foi inspirada unicamente pelo princípio do sacrifício de si mesmo - o ministério do amor. "Eu sou devedor," disse ele, "tanto a gregos como a bárbaros, tanto a sábios como a ignorantes". "O amor de Cristo nos constrange". (Romanos 1:14; II Coríntios 5:14).
Como o maior dos ensinadores humanos, Paulo aceitava os mais humildes deveres assim como os mais elevados. Reconhecia a necessidade do trabalho tanto para as mãos como para a mente, e trabalhava num ofício para a manutenção própria. Prosseguia com o seu ofício de fazer tendas ao mesmo tempo que diariamente pregava o evangelho nos grandes centros da civilização.
"Estas mãos me serviram", disse ele, ao despedir-se dos anciãos de Éfeso, "para o que me era necessário, a mim e aos que estão comigo." Atos 20:34.
Conquanto possuísse altos dotes intelectuais, a vida de Paulo revelava o poder de uma sabedoria mais rara. Princípios do mais profundo alcance, princípios a respeito dos quais os maiores espíritos do seu tempo eram ignorantes, desdobravam-se em seus ensinos e exemplificavam-se em sua vida. Ele possuía a maior de todas as sabedorias - a que proporciona prontidão para discernir e simpatia de coração, e que põe o homem em contato com os homens, e o habilita a suscitar sua melhor natureza e inspirá-los a uma vida mais elevada.

- Escute-lhe as palavras diante dos pagãos de Listra, quando ele os dirige a Deus, revelado na Natureza, fonte de todo o bem, "dando-vos chuvas e tempos frutíferos, enchendo de mantimento e de alegria o vosso coração". Atos 14:17.
- Veja-o na masmorra em Filipos, onde apesar de ter o corpo dolorido pelas torturas, o seu cântico de louvor quebrava o silêncio da meia-noite. Depois que o terremoto abre as portas da prisão, a sua voz é de novo ouvida em palavras de ânimo ao carcereiro pagão: "Não te faças nenhum mal, que todos aqui estamos" (Atos 16:28) - cada um em seu lugar, constrangido pela presença de um companheiro de prisão. E o carcereiro, convicto da realidade daquela fé que sustinha a Paulo, inquire acerca do caminho da salvação, e com toda a sua casa se une ao grupo perseguido dos discípulos de Cristo.
- Veja Paulo em Atenas perante o conselho do Areópago, defrontando ciência com ciência, lógica com lógica, filosofia com filosofia. Notai como, com aquele tato oriundo do amor divino, aponta a Jeová como o "Deus desconhecido" (Atos 17:23), ao qual os seus ouvintes têm ignorantemente adorado; e com palavras citadas de um poeta deles mesmos, descreve-O como um Pai de quem eles próprios são filhos.
- Ouvi-o, naquela época de diferenças sociais em que os direitos do homem, como tal, não eram absolutamente reconhecidos, a apresentar a grande verdade da fraternidade humana, declarando que Deus "de um só fez toda a geração dos homens para habitar sobre toda a face da Terra". Atos 17:26. Então mostra como, à maneira de um fio de ouro, se desenrola o propósito divino da graça e misericórdia através de todo o trato de Deus com o homem. Ele determinou "os tempos já dantes ordenados e os limites da sua habitação, para que buscassem ao Senhor, se, porventura, tateando, O pudessem achar, ainda que não está longe de cada um de nós". Atos 17:26 e 27.
- Ouça-o na corte de Festo, quando o rei Agripa, convencido da verdade do evangelho, exclama: "Por pouco me queres persuadir a que me faça cristão!" Atos 26:28. Com que gentil cortesia, apontando para a sua cadeia, Paulo responde: "Prouvera a Deus que, ou por pouco ou por muito, não somente tu, mas também todos quantos hoje me estão ouvindo se tornassem tais qual eu sou, exceto estas cadeias." Atos 26:29.

Assim passou a vida, como a descreve em suas próprias palavras - "em viagens, muitas vezes; em perigos de rios, em perigos de ladrões, em perigos dos da minha nação, em perigos dos gentios, em perigos na cidade, em perigos no deserto, em perigos no mar, em perigos entre os falsos irmãos; em trabalhos e fadiga, em vigílias, muitas vezes, em fome e sede, em jejum, muitas vezes, em frio e nudez". II Coríntios 11:26 e 27.
"Somos injuriados", disse ele, "e bendizemos; somos perseguidos e sofremos; somos blasfemados e rogamos" (I Coríntios 4:12 e 13); "como contristados, mas sempre alegres; como pobres, mas enriquecendo a muitos; como nada tendo e possuindo tudo." II Coríntios 6:10.
Encontrava ele a alegria no servir; e ao terminar a vida de trabalho, olhando para trás às lutas e triunfos, podia dizer: "Combati o bom combate." II Timóteo 4:7.

Estas histórias são de interesse vital. A ninguém são elas de maior importância do que aos jovens. Moisés renunciou a um reino em perspetiva; Paulo, às vantagens da riqueza e honra entre o seu povo, para levar uma vida de pesados encargos no serviço de Deus. A muitas pessoas a vida destes homens parece ser de renúncia e sacrifício. Foi realmente assim? Moisés considerava a injúria de Cristo maiores riquezas do que os tesouros do Egito. Ele assim considerava porque assim era. Paulo declarou: "O que para mim era ganho reputei-o perda por Cristo. E, na verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo Qual sofri a perda de todas estas coisas e as considero como esterco, para que possa ganhar a Cristo." Filipenses 3:7 e 8. Ele estava satisfeito com a sua escolha.
A Moisés era oferecido o palácio dos Faraós e o trono do rei; mas os prazeres pecaminosos que fazem com que os homens se esqueçam de Deus, prevaleciam naquelas cortes senhoris, e em lugar deles escolheu "riquezas duráveis e justiça". Provérbios 8:18. Em vez de se ligar às grandezas do Egito, preferiu unir a vida ao propósito divino. Em vez de dar leis ao Egito, por direção divina deu-as ao mundo.
Tornou-se o instrumento de Deus em transmitir ao homem aqueles princípios (Os Dez Mandamentos) que são a salvaguarda tanto do Lar como da Sociedade, e que são a pedra fundamental da prosperidade das nações - princípios hoje reconhecidos pelos maiores homens do mundo como o fundamento de tudo o que é melhor nos governos humanos. A grandeza do Egito jaz no pó. Passaram-se seu poderio e civilização. Mas a obra de Moisés jamais poderá perecer. Os grandes princípios de justiça, os quais ele viveu, são eternos.



A vida de Moisés, de trabalhos e de cuidados que pesavam sobre o coração, foi iluminada com a presença d'Aquele que "traz a bandeira entre dez mil", e é "totalmente desejável". (Cantares de Salomão 5:10 e 16.) Com Cristo na peregrinação do deserto, com Cristo no monte da transfiguração, com Cristo nas cortes celestiais, foi a sua vida abençoada na Terra e honrada no Céu.
Paulo também era em seus múltiplos trabalhos protegido pelo poder mantenedor da Sua presença. "Posso todas as coisas", disse ele, "n'Aquele que me fortalece." Filipenses 4:13. "Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, ou a angústia, ou a perseguição, ou a fome, ou a nudez, ou o perigo, ou a espada?" Romanos 8:35. "Mas em todas estas coisas somos mais do que vencedores, por Aquele que nos amou. Porque estou certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor!" Romanos 8:37-39.
Havia, contudo, uma alegria futura para a qual Paulo olhava como a recompensa de seus trabalhos - a mesma alegria por causa da qual Cristo suportou a cruz e desdenhou a ignomínia - a alegria de ver o fruto do Seu trabalho. "Qual é a nossa esperança, ou gozo, ou coroa de glória?" escreveu ele aos conversos de Tessalónica. "Porventura, não o sois vós também diante de nosso Senhor Jesus Cristo em Sua vinda? Na verdade, vós sois a nossa glória e gozo." I Tessalonicenses 2:19 e 20.

Quem poderá calcular os resultados dos trabalhos de Paulo, para o mundo? De todas estas benéficas influências que aliviam o sofrimento, que confortam a tristeza, que restringem o mal, que erguem a vida de sua condição egoísta e sensual, e a glorificam com a esperança da imortalidade, quanto se deve aos trabalhos de Paulo e de seus cooperadores, quando, com o evangelho do Filho de Deus, fizeram sua silenciosa viagem da Ásia às praias da Europa?
Qual o valor de uma vida que serviu de instrumento de Deus para colocar em ação tais influências abençoadoras? O que não valerá na eternidade testemunhar os resultados de um tal trabalho?

Ellen G. White in Educação, Casa Publicadora Brasileira.