sexta-feira, 12 de março de 2010

A BÍBLIA E A PSIQUIATRIA


Certo dia chegou um novo doente ao meu consultório, e ao ver em cima da secretária um exemplar da Sagrada Escritura, perguntou-me: "O Doutor, um psiquiatra, lê a Bíblia?"
- Não só a leio - respondi-lhe -, mas estudo-a. Este é o melhor livro que jamais se escreveu sobre a conduta humana. Se os seus ensinos fossem seguidos, muitos de nós, os psiquiatras, teríamos de fechar os nossos consultórios e de procurar outro modo de vida.
- Refere-se aos Dez Mandamentos e à Regra Áurea, que pede que façamos aos outros o que queremos que os outros nos façam a nós?
- A isso, mas ainda a muito mais - respondi. Há na Bíblia dezenas de verdades que têm um profundo valor psiquiátrico. Pense no seu caso. Acaba de me contar que, sem nenhum resultado, fez isto e tentou aquilo. Está bem claro que se debate numa situação de ansiedade aguda. Não é assim?
- É por isso, precisamente, que aqui estou - respondeu secamente.

Peguei na Biblia e li em voz alta um conselho que São Paulo dá numa das suas epístolas: «Não andeis ansiosos de coisa alguma; em tudo, porém, sejam conhecidas diante de Deus as vossas petições, pela oração e pela súplica, com acções de graças. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e as vossas mentes em Cristo Jesus.» Filipenses 4:6,7. Dirigi-me em seguida ao meu doente: - Agora, que quer dizer isto? Exactamente o que reza o texto. Que não devemos estar preocupados, mas confiar em Deus e ser gratos. Ganhamos porventura alguma coisa atormentando-nos, dando voltas dentro do mesmo círculo? Removendo uma e outra vez a mesma terra que acaba de ser lavrada? O que o senhor realmente necessita, mais do que uma solução para esse problema particular, é de paz de espírito. E aqui tem a fórmula: descanse, tranquilize-se, e deixe de revolver na sua consciência essa dificuldade. Deixe que actue o poder criativo da subconsciência. Pode ser que tudo se resolva simplesmente por deixar de torturar-se como o está a fazer agora.
O meu doente ficou pensativo.
- Talvez - disse - me devesse dedicar a ler um pouco a Bíblia.

Parece insensato não aproveitar a sabedoria recolhida desde há três mil anos. Muitos séculos antes da Psiquiatria, a Bíblia ensinou que «o reino de Deus está dentro em vós.» S.Lucas 17:21. Nós, psiquiatras, chamamos a isto a mente inconsciente, mas só as palavras é que são novas, não o conceito. Desde o princípio até ao fim, a Bíblia ensina que a alma humana é um campo de batalha em que lutam o bem e o mal. Falamos de forças agressivas, hostis, que contendem com impulsos de amor na natureza humana. De outro modo, dizemos o mesmo que o texto sagrado.
O que a Psiquiatria fez foi dar terminologia científica a verdades que a Bíblia declara sob a forma de parábolas, alegorias e poesias. O que descobriu essencialmente Freud e os que se lhe seguiram? Que a mente humana funciona a dois níveis, o consciente e o inconsciente. Que assim opera o nosso psíquico, e que muitas pressões e desequilíbrios emocionais são causados pela acção oculta do nível inconsciente.

Ainda supondo que possuímos muitos conhecimentos de Psiquiatria, é sumamente interessante ler a Bíblia. Eis algumas das minhas passagens favoritas, cujas palavras encontro tão cheias de significado que bem merecem que as aprendam de cor, e periodicamente as repitam, todos os que cuidam da sua saúde mental: «Por baixo de ti, (Deus) estende os braços eternos.» Deuteronómio 33:27.
Outra tradução mais livre da passagem diz: «os Seus braços te sustêm.» Durante centenas de anos, muitas almas perturbadas encontraram consolo nestas palavras de Deuteronómio. E não é de admirar. Um dos nossos temores inatos é o de sofrer uma queda; daí a ideia de sentirmo-nos firmes e seguros.
Este conceito relaciona-se com um dos nossos sentidos de comunicação - o tacto, e por isso esta imagem bíblica proporciona-nos uma sensação de paz. Se sofreis de ansiedade e de insónia, procurai repetir essas palavras à hora de vos deitardes, e serão mais benéficas do que qualquer comprimido para dormir.

«Amarás o teu próximo como a ti mesmo» S. Marcos 12:31. Muitos crêem que este nobre conceito só aparece no Novo Testamento. Na realidade encontra-se no livro de Levítico, capítulo 19:18. E, o que é muito digno de nota para um psiquiatra, a Bíblia reconhece o facto de que, para que a pessoa goze de equilíbrio emocional, tem de amar-se a si mesma tanto como aos outros.
A falta de estima própria é, provavelmente, a maior causa de desequilíbrio mental entre os que me pedem tratamento. Frequentemente é o nível inconsciente do nosso psiquismo que está causando essa sugestão de que nada valemos. Recordo uma senhora que veio ao meu consultório esmagada sob o peso de uma culpa. Eu não podia desfazer o que ela tinha feito. Mas talvez pudesse ajudá-la a entender por que o tinha feito, e como o mecanismo da sua mente, funcionando ao nível infraconsciente, a estava a atormentar. Recomendei-lhe que lesse e relesse a história do filho pródigo para reflectir na sua mensagem de compaixão e misericórdia. Como pode alguém sentir-se total e irremediavelmente condenado, rejeitado, quando existe a promessa que ressoa através dos séculos de que há um Pai amante, disposto a perdoar e a esquecer toda a culpa?

«Não vos inquieteis pelo dia de amanhã» S. Mateus 6:24. Uma reconstrução moderna deste pensamento seria: «Deixa de angustiar-te com o futuro.» A angústia causa tensão. A tensão bloqueia o fluxo de energia criativa que brota do inconsciente. E quando essa energia se debilita, os problemas multiplicam-se.
Quase todos temos por sabido que a preocupação nada resolve. Todavia, muitos vivem em constante preocupação e angústia.

«Basta a cada dia o seu mal», diz a Bíblia. Aqui e agora todos temos problemas para cuja solução devemos esforçarmo-nos. A única coisa que temos de aproveitável é o Presente que estamos a viver. E há que tirar dele o maior partido. Cada dia devemos confirmar-nos na fé de que o Poder que nos trouxe ao mundo nos ajudará nas futuras emergências, sejam elas quais forem. «Os que esperam no Senhor» - canta Isaías - «renovarão as suas forças, subirão com asas como águias.» Isaías 40.31. Porquê? Porque a sua fé lhes evitará a preocupação.

E se me pedissem para assinalar alguma das passagens da Bíblia como a mais excelente, eu escolheria esta: «Conhecereis a Verdade, e a Verdade vos Libertará.» S. João 8:32. Nesta tremenda frase encerra-se toda a teoria e todo o método da Psiquiatria. Nove vezes em cada dez, quando as pessoas me procuram atormentadas com sentimentos de culpa, combatidas pelo stresse, extenuadas por ocultos impulsos de ódio, é porque não encontraram a verdade do que lhes sucede. E o papel do Psiquiatra é remover os enganos e desculpas com que se disfarçam os recônditos motivos que constituem a verdade de cada caso. É sua tarefa trazer ao plano da conciência manifesta esses recônditos conflitos, para poder tratá-los. Como dizia Freud: «A razão é uma pequena voz, mas faz-se ouvir persistentemente.» Uma vez que se lhe preste atenção, pode começar a cura do mal, porque a verdade é a única libertadora.
Nunca vos será dado conhecer toda a verdade. As grandes interrogações da vida e da morte, do bem e do mal, permanecem sem resposta, e devem permanecer assim, como o proclama Job com eloquência. Mas uma coisa é clara. Escondidas dentro de nós, no inconsciente de cada um, actuam as mesmas forças elementares de ódio e de amor que têm agitado o género humano desde o seu começo. É essa zona do espírito que explora o Psiquiatra, por vezes com êxito e por vezes sem ele.

Mas há um antigo livro que trata desses assuntos, e os entende profunda e intuitivamente; um livro que durante mais de 3 000 anos tem ajudado a enfrentar os seus conflitos toda a pessoa desejosa de aproveitá-lo. Esse livro é a Bíblia!

Smiley Blanton
Médico Psiquiatra