quinta-feira, 31 de maio de 2012

          TABACO
(Dia Mundial Sem Tabaco)




Estou certo de que o leitor está suficientemente informado para saber que o consumo de cigarros está, indiscutivelmente, incluído entre os três principais factores de risco da doença coronária.* O eco de múltiplas e sucessivas campanhas contra os malefícios do tabaco já deve ter chegado até si, de forma a permitir-lhe saber também que os riscos que mais têm sido postos em destaque para os fumadores são a bronquite crónica e o cancro do pulmão, não obstante mais de metade do excesso de mortes nos fumadores ser, contudo, devida a doenças cardiovasculares.
Se, ainda assim, me confessa que fuma muito e sobretudo se é jovem, fico mais preocupado. Chamo-lhe a atenção para o facto de que os indivíduos que fumam mais de 20 cigarros por dia e os que começam a fumar antes dos 20 anos, têm duas vezes mais probabilidades de morrer por doenças do coração do que os não fumadores.

Não vou ao ponto de dizer, como Fernando de Pádua, que fumar é um vício maricas, mas o que é certo é que, actualmente, as mulheres fumam mais do que os homens! Esquecem, contudo, que o grande consumo de cigarros aumenta o risco de morte súbita e que, além disso, as mulheres que fumam e usam 'pílula' correm ainda um risco maior, que pode ser cinco vezes mais frequente.

ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DE TEMPERANÇA/MOVIMENTO TABACO OU SAÚDE


Tem sido sugerido que seja coincidente e não causal a grande associação entre o fumo do cigarro e as doenças das coronárias.* É que aqueles que têm tendência para sofrer de doença coronária são também o tipo de pessoa que constitucionalmente têm mais tendência para fumar. Contudo a 'hipótese constitucional' não pode explicar facilmente o menor risco de doença coronária nos ex-fumadores. É indiscutível que os factores constitucionais e familiares afectam o risco de morte por doenças do coração, mas não se provou ainda que qualquer desses factores explique a associação entre o tabagismo e a doença coronária.

Considero no entanto ser tão perigoso o vício de fumar, que sou um grande fumador completamente regenerado, até por saber que os perigos do tabaco podem surgir, ainda que fumando cigarros sem nicotina, talvez pelo efeito de outro constituinte do fumo do tabaco, o monóxido de carbono.

Embora o risco de doença coronária nos fumadores de cachimbo e de charuto pareça ser só ligeiramente maior do que nos não fumadores, é possível que a mudança do cigarro para o cachimbo, charuto ou cigarrilha não resulte na correspondente redução do risco.

Se o quadro que mostra a relação entre as doenças cardíacas e o tabagismo está sobrecarregado de pinceladas de tons cinzentos, o painel que põe em evidência a estreita ligação entre consumo de cigarros e trombose cerebral ou doença vascular periférica, está totalmente pintado com tinta negra, como que representando o cartão de visita de uma agência funerária. De facto temos que considerar que há uma associação ainda mais estreita entre o fumo e o quadro de entorpecimento, debilidade e rigidez dolorosa das pernas, que surge depois de algum tempo de marcha, e que desaparece com o repouso, a que se dá o nome de claudicação intermitente.

Ficamos então com a ideia de que o perigo do tabagismo é maior para a doença vascular periférica, seguido de morte súbita e enfarte do miocárdio, principalmente em homens jovens que fumam muito.


A um meu amigo, jovem médico, perfeitamente conhecedor destas verdades e que, inconscientemente, continuava durante o almoço a conspurcar o meu bife com o fumo do seu cigarro, dediquei um dia esta quadra:
                                    A não ser que Deus te valha,
                                    Se não deixares de fumar,
                                    Tens no cigarro a mortalha,
                                    Em que irás a enterrar.

Os principais constituintes do fumo do tabaco, que se pensa afectarem o coração, são o monóxido de carbono e a nicotina; o primeiro leva a níveis de carboxi-hemoglobina da ordem dos 10 a 15%, reduzindo o total de oxigénio disponível para o músculo cardíaco (miocárdio), e a segunda estimula a secreção de catecolaminas, que são hormonas da glândula suprarrenal, aumentando assim o trabalho do coração. Tanto um como outro aceleram a aterosclerose.*

Fumar 20 cigarros por dia duplica aproximadamente o risco de ter um ataque do coração, e quando o fumador tem o colesterol ou a tensão arterial elevados, o risco é consideravelmente aumentado.

A maioria dos adolescentes que começam a fumar vem a tornar-se adultos fumadores e a dependência é tão grande que apenas 15% dos fumadores param antes dos 60 anos de idade.

Parece ser muito mais fácil não começar a fumar do que parar de o fazer. Aconselhe os seus filhos a não experimentar... Se não conseguir, faça com que deixem de fumar atempadamente, pois parece que se verifica uma redução do risco de ocorrência de enfarte do miocárdio ou de morte por doença coronária, nos que param de fumar. Mesmo nos homens de meia-idade, que durante muitos anos foram grandes fumadores, parece reduzir-se o risco de um acidente coronário, quando deixam de fumar.*

Perante estas negras hipóteses, decida-se! Deite fora o último maço de cigarros que comprou... Assim fazendo, liberta-se da tosse e de infecções pulmonares, e pode melhorar da sua angina de peito e, se tem claudicação intermitente, terá menos probabilidades de vir a precisar de uma amputação.


Não resisto a introduzir uma jocosa forma de publicidade anti-tabaco que vi afixada na parede dum apagado Café algures para os lados de Lamego:
                                    "Fumador: a fumaça do seu cigarro é o resíduo do seu prazer. Porém, ela polui o ar, o meu cabelo, a minha roupa e os meus pulmões. Tudo isto sem o meu consentimento. Acontece que eu também tenho um prazer: gosto de tomar umas cervejinhas. O resíduo do meu prazer é a urina. Você ficaria aborrecido se eu fizesse xixi na sua cabeça?"

Como médico, aconselho-o. Como amigo, lamento que por vezes seja alvo duma certa marginalização, tanto mais acérrima quanto liderada pelos fumadores regenerados. É que a estes é mais doloroso ser fumador passivo e nem o artº 2º do Dec. Lei Nº 226/83, que não permite fumar em determinados locais, os protege!

Para si que é fumador, e continua a ler o jornal de cigarro na mão, lembro-lhe uma vez mais:

- Os fumadores morrem duas vezes mais do que os não fumadores, antes dos 65 anos.
- O tabagismo é a causa conhecida mais importante de cancro das vias respiratórias.
- É factor de risco "major" de doença coronária, acidente vascular cerebral, doença vascular periférica e aneurismas, particularmente em população com valores médios de colesterol total elevados.

Se ficou "ligeiramente" assustado, reveja alguns conselhos:

- Chame a si toda a força de vontade de que é capaz e suspenda o consumo de cigarros.
- Se não é capaz de deixar totalmente de fumar, não inale o fumo e fume só cigarros com filtro e menos de 5 por dia.
- Um tranquilizante pode ajudá-lo durante o período de desabituação.
- Tente um medicamento anti-tabaco.

É evidente que não é fácil irradicar um hábito tão aceite e arreigado na sociedade de hoje. No entanto algumas normas devem começar ou continuar a ser postas em prática, porque delas poderão depender a saúde e a sobrevivência dos incautos que arrastam, constantemente, uma nuvenzinha de fumo atrás de si. Poderão ser:

- Aumentos progressivos dos impostos sobre o tabaco.
- Supressão da publicidade da indústria do tabaco.
- Apoio a programas públicos de Educação para a Saúde.
- Proibição rigorosa de fumar em Hospitais, Escolas, Casas de Espectáculos, Restaurantes.
- Encorajar actividades alternativas para a indústria do tabaco.
- Retirar subsídios para a produção do tabaco nos países produtores.
- Influenciar a criação de uma política activa contra o tabaco a nível nacional.
- Informar sistematicamente o público, através dos meios de comunicação social, dos perigos do tabagismo para a saúde, dando aos fumadores um plano bem definido para conseguir parar por completo e um apoio continuado durante o período de desabituação.
- Avisar particularmente as crianças filhas de pais que já tiveram um acidente cardíaco.
- Lembrar, antes de tudo, que não fumar é que deve ser encarado como um comportamento normal e não o contrário.

O QUE ACABÁMOS DE REFERIR NÃO SERÁ SUFICIENTE PARA DIZER NÃO!... AO TABAGISMO?

                                    Se não és não queiras ser,
                                    Nem por exibicionismo,
                                    Se não queres adoecer,
                                    Diz que não, ao tabagismo!

                                    Se ainda andas por cá,
                                    E tens gosto de viver,
                                    Se és fumador, pára já,
                                    Se não és, não queiras ser.

                                    Protege o teu coração,
                                    E deixa-te de lirismo,
                                    Não te armes em fumão,
                                    Nem por exibicionismo.

                                    Não vais dar parte de fraco,
                                    Se não te agrada morrer;
                                    Deixa o fumo do tabaco,
                                    Se não queres adoecer.

                                    Se os teus pulmões se consomem,
                                    Deixa lá o masoquismo;
                                    Mostra que és Mulher ou Homem,

                                    DIZ QUE NÃO, AO TABAGISMO!

Políbio Serra e Silva, Professor Catedrático de Endocrinologia, Doenças Metabólicas e Nutrição
da Faculdade de Medicina de Coimbra in PREVENÇÃO VASCULAR



*Leia sobre Doença Coronária e Aterosclerose em Leituras para a Vida, 24.09.2011 - Links 1R